sábado, 19 de dezembro de 2009

LembrançaS a Carvão

Tudo que tenho dela é um único retrato,
Uma recordação pitoresca de algo que foi e que desconheço hoje.
Pálida sem tinta,
Numa folha prescrita a carvão.
Sem expressão fita meu rosto,
Pedindo-me que a retoque como se eu fosse uma artista,
Que lhe puxe aqui e lhe sombreie acolá.
E eu na minha ignorância respondo-lhe,
Fazendo dela um estudo anatómico de estética imperfeita.
Não posso pintá-la como não é,
A Realidade não tem nem deve ser necessariamente Bela.
Para mim era.
Percorro com o lápis a expressão numérica que lhe deu proporção,
E sem dar por isso, altero-lhe,
Modelo-lhe, Corrijo-lhe as gralhas e a falta de expressividade.
Levemente vai sorrindo e alteando as sobrancelhas,
Calmamente vai aceitando meu toque como aquele único,
Desejado, carinhoso, genuíno.
Agora sim vai sendo obra mas pede-me mais.
Quer cor, nitidez, brilho para que deixe de ser sonâmbula entre os livros,
E possa pousar na parede e fitar toda a sala.
Até que deixa de fitar…
Começa a ver e a esvoaçar olhares a toda a gente.
Quase propositadamente, oferecesse, esbanjando a sua personalidade híbrida
E fazendo palpitar todo o homem que anda á fêmea.
Enciúmo-me.
E começo a odiá-la ameaçando até apagá-la definitivamente desta folha de papel.
Não passa disso.
De um retrato numa folha de papel,
Mesmo pensando que é Deusa e que poderá tingir os céus.

1 comentário:

Pedro disse...

Deixas-me curioso . . .