sexta-feira, 30 de janeiro de 2009

CarTa da MorTe


“Eles passam por mim á entrada. Não me vêem mas sentem-me a rodea-los. Chegam exaustos, em vagões de trem, muito sujos e quase chacinados. A alguns já Caronte lhe pedira o óbolo durante a viagem. Não chegaram até aqui. Lembro-me de um em especial, que quando a mim se entregou, ainda trazia a pisada marcada no rosto. Certamente, morreria e caira. Outros, treparam-lhe em cima talvez. Não havia lugar para tantos. Ás vezes tinha pena deles, mas minha função é levá-los. A outra entidade lhe era reservado o esforço de mantê-los vivos.
Quando chegavam apercebiam-se de que haviam sido enganados. Muitos deles não sabiam. Levavam-nos! O mesmo homem que morria lentamente era aquele que matava. Eram iguais! Levarei um primeiro e certamente o outro depois. Mais tarde ou mais cedo, ambos virão a mim. É curioso como homens matam homens sendo eles conterraneos. Se o homem não tem respeito pela propria humanidade porque motivo teria eu de respeitá-los a eles, reles humanos?
Dividiam-nos! Os pais choravam porque os separavam dos seus filhos, certos de que eles não sobreviveriam e os filhos acenavam, crentes de que voltariam a vê-los. Uns ainda tentavam resistir-me mas a outros lhe era dado um bem maior. Aqueles que resistiam eram feitos prisioneiros. Os outros, tornavam-se meus inquilinos. Não pagam renda e têm dois destinos á escolha. Empurravam-nos com as pontas das armas, mantendo o dedo no gatilho. Havia homens e mulheres e muitas crianças. Alguns ainda traziam a Estrela de David presa no braço. Caiam e ajoelhavam-se. Aqui havia outro que me custou levar. Havia caído. Chovia nesse dia e enterrara os joelhos na lama com tanta força que dias e dias depois, ainda lá estava o molde da perna, marcado no chão lamacento, agora íntegro e seco. Não durou muito, mas resistiu até á ultima. A sua mulher tinha sido feita prisioneira e seu filho, morreu com certeza, muito antes dele. Quando chegou a mim, pediu-me que trouxesse o pai e acedi ao seu pedido. Ambos se livraram de um destino muito pior, sobreviver. A mãe morrera algum tempo depois, escrava de experiencias cientificas. Dizem, quem lhe vira o corpo, que padecera de fortes convulsões cutâneas, mas quando chegou a mim vinha limpa e bela. Era judiã. Já havia recebido seu pai e também dois seus irmãos. Toda uma familia, todas as gerações ali, vitimas de uma humanidade inexistente.
Uma vez lembro-me bem, chegou uma criança. Era loira e padecia de uma grave enfermidade. Pelo menos, pensavam na época. Veio a saber-se que se chamava Varicela. Um soldado veio dar-lhe a mão a fim de guiá-la. Ao que me pareceu, ainda lhe restavam sinais de humanidade, ainda podia redimir-se ou negar-se. Mas guiou-a sem a olhar. Largou-a! O medo do contagio era imenso. Esse mesmo soldado viria a morrer antes da pobre criança, por se ter revelado demasiadas vezes humano. Foi executado do outro lado do arame e enterrado numa vala comum, juntamente com as pessoas que ajudou a matar.
Um dia fartei-me e decidi ver por mim mesma. Entrei e vasculhei todas as salas. Podia ver
pobre coitados, que faleceriam em breve, a cortarem os cabelos das mulheres, a tirarem os dentes de ouro e a arrancaram relógios dos pulsos, antes de os enviarem para as camaras de gás. E noutra sala, havia um médico que escolhia a dedo, aqueles que serviam e aqueles que eram dispensáveis. Ele pensava ser o Destino! Julgava-se melhor que todos e pior que nenhum. Exibia a sua bata branca quando saía do campo. Eu segui-o uma quantas vezes. Tem familia, filhos e mulher. Da última vez foi para levá-lo.
Do outro lado, sentia-se um calor imenso, quase incendiário dos fornos em brasa. Era para ali que iam os desperdicios humanos, depois de lhes terem arrancado os cabelos e as peles. Quantos submarinos se isolaram com aqueles cabelos mantendo-se a flutuar. E as peles, eram usadas como sabonetes pelos soldados. Podia observá-los a lavarem-se, esfregando todas aquelas peles pelo corpo, embutigadas de sabão saloio e rasgando-se pouco a pouco do uso exagerado. Não parecia ser um problema, arranjar-se-iam outras idênticas, tão suaves como as primeiras.
Parecia haver naquele lugar duas realidades, duas dimensões com sentimentos diferentes, com paladares e olhares diferentes, com cheiros muito diferentes. Voltei para a entrada! Tinha que recebê-los sabendo que os iria levar em breve. É leve a minha cortesia mas servia para consolá-los daquele terrivel destino. Alguns soltavam-me olhares, mesmo sabendo que tinham os dias contados. Outros, persentindo a minha presença, caminhavam e olhavam para trás. É incrivel de como sou invisivel para uns e tão nitida para outros, sendo ambos humanos.
Tenho pena por muitos deles. Foi o homem que ditou os seus caminho não eu. Muitos só seriam levados dali a muitos anos, quando fossem pais ou avós. Na minha lista consta que a maioria deles não tinham ali o seu fim. Mas a falta de humanidade, a falta de misericórdia, a deficiente ambição rezaram mais alto. Todos eles se foram porque um homem se achou Deus, julgando-os pela sua origem e não pelas suas virtudes e defeitos. Um homem que também eu levei, quando na minha lista, o seu nome constava. Não posso antecipar mortes nem adiá-las. Sou uma força do Universo e não me é permitido fazer batota. Chamo-me Morte! Ainda vivo naquele campo sem cor. Continuo á porta. Hoje vejo passar turistas, desejosos de saberem que histórias se contam daquele lugar amaldiçoado. Para minha surpresa, vi passar não á muito, a mesma loira criança que seguia pelas mãos do soldado. Era robusta e fazia-se acompanhar de duas crianças por ambas mãos. Restavam-lhe ainda moléstias da varicela. É uma daquelas que constam no fim da minha lista. Não estava destinada a ter um destino tão miserável, tão submisso. Guiava as duas crianças pela mão. Então, aquele soldado levantou-se e olhou-as, o mesmo que a levara pela mão quando era ainda pequena. Surpreendeu-se como algo tão frágil pudera ter sobrevivido quando ele não o fez. Eu pus-lhe a mão sobre o ombro e disse-lhe:
“Ser humano vem com uma maldição. Somos nós que fazemos o nosso caminho. Tu escolhes-te o teu, há que saber fazer a escolha certa. A sua inocência acabou por salvá-la e a tua culpa fez de ti mais um cadáver. Quando se escolhe um caminho a passagem fecha-se. É impossivel voltar atrás.”
Escrevo esta carta porque o meu trabalho está terminado. O homem ocupou o meu lugar. Ele decide quem morre e quem sobrevive. Eu fico ali á entrada do campo, á espera que me chamem para ocupar de novo o lugar que me pertence.”


(Em memória das vitimas do Genocidio)

LiçãO idealiZada da Moral Humana

Acho puramente piada áquelas pessoas que me ignoram por completo e depois fingem estar tudo bem! Cinicas por completo, pensam que aos olhos de todos as coisas continuam iguais mas o meu poder de controle assume-se permanente. Faço com que pensem aquilo que a mim me convém que pensem, faço com que façam aquilo que a mim me convém que façam. Sou maléfica! Eu sei…mas na lei do mais forte os truques contam. E depois passam e dizem “Olá”. Entristeceme por completo tentarem ser simpáticas quando a única coisa que fazem é ignorar-nos e limito-me a pagar na mesma moeda. Ignoram-me uma vez, não mais. Sou impaciente e não tenho nada a perder, tenho mais pressa de viver. Tudo aquilo por que luto revela-se insuficiente. Falhei e contento-me com o facto de ter tentado. Mas fico horripilantemente angustiada, quando me fala sem sequer saber porquê. Não lhe peço que o faça mas insiste em fazê-lo sabendo de antemão que não vou responder-lhe. Cansei-me de tentar dialogar. Calei por completo. Quero lá saber o que pensa….já nem sequer me interessa aquilo que acha bem ou que acha mal. Que desapareça…Pagava a Deus umas férias se a fizesse desaparecer.
É tão móbil e mesmo assim insiste em pensar que é muito segura e muito responsável. É preciso ser corajosa para insistir nessas cobardias sem fundamentos nem leis cientificas. E é triste vê-la a pensar que tudo isto está comigo, quando está com toda a gente. Já não sou só eu. A maioria estranha-a. As minhas razões são legitimas. As dos outros não sei, talvez sejam.
Se sabe que não lhe vou responder para que tenta falar-me? É inútil, já devia tê-lo percebido. Posso não estar a proceder bem e sei que ela não tem culpa. Mas eu sou assim e quando me magoam simplesmente desligo por completo. Podia apanhá-la desprevenida, armar um escândalo mas eu sou discreta…Não o faço porque sei que não iria mudar nada. Aconteceu o que tinha de acontecer. Se foi preciso ela fazer o que fez e ignorar-me apenas para eu perceber que afinal não era quem eu pensava, então conseguiu. Se foi preciso ignorar-me para descobrir que afinal tenho restrições, então empenhou-se bastante. Se foi preciso mentir-me e dizer que tudo se ia resolver para me fazer entender que há coisas que não têm solução, esmerou-se no seu tom coloquial e profissional. Mas há bastantes coisas que deveria ter feito e não fez assim como há demasiadas coisas que eu deveria ter dito e não disse. Ainda vou a tempo mas agora, tudo que ela fez para me fazer entender certas coisas está cá dentro, incorporou-se e não há quem o tire. Nem eu, nem ela. Nem ninguém. Sou teimosa e percorro o universo em busca dos ideais perfeitos. Troco os antigos e substituo-os pelos mais recentes, sempre em busca da modernidade. Aprendi que os nossos ideais nunca são os correctos e que as pessoas nunca são quem dizem ser. Há coisas que me ultrapassam. E aquela imagem de lunática á procura do conhecimento humano começa a transcender-me.

EsCada de CaraCol


A minha vida é como uma escada de caracol. Desço, subo e continuo confusa. A regularidade das formas arredondadas, o aumento da vertigem e o medo de subir mais alto, dificultam a chegada ao cume e impedem-me de voltar ao inicio. E fico ali, incrivelmente superada pelo medo e pela incerteza. Não sei se desça e desista mas também não me sinto motivada a subir e arriscar.
Já dei demasiado de mim. Já me superei a mim mesma e já surpreendi a mais inesperada das pessoas. Não lhe vejo os degraus e o corrimão está demasiado longe. Não consigo arragar-me. E quando tento fazê-lo, escorraça-me, queima-me e diz-me que tenho que subir sozinha, porque afinal naquele caracol imenso, eu estou sozinha. Pois é, estou sozinha. Não posso voltar para trás e apagar o passado e tenho medo de seguir em frente sem ela. Gostava de nunca ter subido esta escada, gostava de nunca ter amado alguém tão diferente e complicada. Gostava de ser ela, sendo eu. Ela podia dar-me a mão e fazer-me subir, mas será que ela mesma sobe? Ou desce? Não creio que me possa ajudar. Talvez pudesse, secretamente, se me deixasse ajudá-la. Mas as teorias sobre aquela escada são imensas. Há quem diga que ambas podemos cair. Mas há quem pense que poderiamos chegar ao cimo, as duas, ultrapassando as vertigens e o próprio medo. Poderíamos fazer daquela escada em que o corrimão mal se vê, uma escada sólida e segura. Ambas as teorias divergem em diferentes versões. Umas pormenorizam, outras são sarcásticas e arrogantes, outras ainda têm esperança e compaixão. Outras depois, questionam se qualquer um dos caminhos está certo. Porque não cruzar os braços e deixar que a escada envelheça e me deixe cair? Porque não resignar-me a subir tanto como a descer? Não sei, sinceramente, não sei.
Tu és a minha escada. Percorri-te até ali e ali fiquei. Sabes que quero subir-te mas tenho medo de faze-lo. Aliás, tu impedes-me a passagem. Negas-me! Consegues ser cruel, consegues fazer-me sentir a pessoa mais inútil no mundo, tens o dom de me matar aos poucos e algum dia morrerei, ali onde fiquei, em ti e por ti. Mas pareces não te preocupar quando os sinais das minha decadência estão cada vez mais nitidos. É pena as pessoas não verem quando precisamos delas, nem que seja para nos fazerem sorrir, quando sorrio simplesmente porque os outros também o fazem.

PerdãO doS anjoS

Com o fim da guerra, os anjos foram banidos do paraíso e obrigados a habitar a Terra. Abdicaram das suas asas e do seu fogo angelical, a fim de sobreviveram entre os humanos. O Criador, não perdoara suas traições. Entre estes anjos, estava Lúcifer que se rebelou contra o Criador e foi aprisionado numa realidade humana, como a nossa. Ele e todos aqueles que o seguiam, descobriram uma nova forma de sobreviverem, tornando-se praticamente humanos, encarnando vidas até então normais. Chamaram-lhes Anjos Caídos.
Os Anjos Caídos tomaram os lugares de homens. Fecundaram suas companheiras e dessa união, nascera uma criação perfeita, uma criaçao não do Criador mas das suas próprias criações. Metade anjo metade humano, o nefilin daria continuidade á presença dos anjos na Terra, seria uma espécie hibrida, perfeita, com poderes angelicais e alma humana. Não eram mostros. Não eram gigantes. Eram homens, cuja vida teria sido proporcionada por uma conjugação suprema entre mensageiros e mensagem. Mas a presença dos hibridos, não iria durar muito. O Criador, invejando tamanha criação e enraivecido pela humanidade que criara para esconder os traidores, encomendou um grande dilúvio, do qual apenas sairam vivos Noé e sua familia. Este teria como principal objectivo, destruir todos os hibridos e impedir que os Anjos Caídos obtivessem a redenção. E agora pergunto-me, porque razão não terão eles direito á redenção se nós somos perdoados todos os dias?
Eles sobreviveram. Pelo menos uma pequena parte deles, sobreviveu. Continuam á espera da redenção. Estão entre nós. Podemos senti-los do outro lado da rua, nas bibliotecas, nos jardins ou mesmo dormindo ao nosso lado. Os nefilins são adoradores da humanidade. A sua alma mortal e o seu desejo humano, fazem-nos sentir cada vez menos especiais, fazem com que a sua integração seja mais fácil. Não sei porquê mas posso senti-los. Sei que estão aí, talvez ao meu lado no café ou na gare. Eles são especiais. Combinam serenidade com revolta e sentem-se extremamente pesados, magoados, amaldiçoados. Não têm culpa de serem fruto de uma união pecaminosa. Os Anjos estão proibidos de lidarem com humanos.
Mesmo assim, penso serem entidades especiais, a combinação perfeita, a conjugação suprema. A única coisa que os torna fracos, é não serem perdoados. PorquÊ? Que culpa têm eles de serem criaturas perfeitas, versáteis, até melhores que nós? Sei que estão algures, sei que muitos deles nos dão a nós, o perdão de que eles não gozam. Ás vezes, tento encontrá-los, tento vê-los, mas os meus olhos não enxergam tamanhas criações! Sou demasiado humana para poder comtemplá-los. E eles são demasiado transcendentes, para terem perdão pelos seus pecados. Como se pode virar o feitiço contra o feitiçeiro! Como podemos nós, reles e antiquados, ausentes e traiçoeiros, ser-mos perdoados….Que direito temos nós, vingativos e guerrilheiros de pedir perdão…
Desejava ser como eles. Embora traidores continuam a ser especiais. Não sofreria, não me lamentaria, mas também não era perdoada. Esconder-me-ia para sempre. Recusar-me-ia a entregar-me, só porque tive a infelicidade de ter caído.
Seguem-nos por toda a parte, partilham as nossas crenças. A única diferença é que eles sabem quando tudo isto terminará e nós continuamos nossa partida de xadrez, crentes de que tudo não acabará nunca.

sábado, 17 de janeiro de 2009

LoveGamia

É-me dificil acreditar mas acho que tenho dois amores! Um nega-me o corpo e a alma. Outro, oferece-me o seu corpo e uma nova alma. Qual escolher? Aquele por que luto ou aquele que luta por mim?
Distingo-os na perfeição e sinto-os de maneira diferente, simultaneos, lutando um contra o outro, tentando ganhar-me terreno. Chamei-lhes Vénus e Adónis.
Vénus é um amor verdadeiro, apaixonado, cheio de desejo e afeição. Mesmo assim é um amor arrebatador, que me magoa e me marca, que tortura e se alimenta do meu próprio sofrimento. É um amor corrente, daqueles como há muitos, de feições comuns e atitudes previsiveis. Nega o facto de ser amado. Submete-se a uma sociedade demasiado massadora e idealista, corrompe-se com o tempo, mas cresce com a distância. Já é adulto! Pertence a Platão. Tem Horóscopo e plano astral. É humano! Chora e ri! Cativa-me com tamanha ironia, percorre-me e faz-me desintegrar. Se fosse um átomo, explodiria! É o combustivel da minha vida, é a carruagem que eu queria apanhar, mas que já partiu sem mim. Cheguei tarde demais, este amor está demasiado longe. Foi o primeiro de muitos. Anseio por ele, por encontrá-lo noutra vida, noutro lugar, de preferência, acessivel. Respiro-o…faz parte de mim. Sinto-me atraída pelo discernimento exagerado ou pela forma de estar descontraída, mas extremamente preocupada. Vénus é amargurada e algo solitária. Porém, pensa ser feliz, quando a felicidade é tão dificil de encontrar. Vive rotinas e tem preferências. Tem virtudes e defeitos como ninguém. Mesmo assim, este amor é perfeito, mesmo que tradicional não seja. Embora não o saiba, ama-se a si mesmo e bloqueia-nos, pelo menos, a mim bloqueia-me. Não percebo porquê mas vejo nele uma extrema curiosidade que tem que satisfazer. Move-se rapidamente, é perfeitamente adaptável. É um disco de vinil transformado em Compact Disc! Mas a música que ouço, é para mim um esgotamento e uma tristeza. Recusa tudo aquilo que lhe digo, ainda que esteja a ser o mais sincera possivel. Não percebo, mas foi isso que Vénus sempre me ensinou, porque também este amor, faz parte de uma aprendizagem corrente e produtiva. Molesta-me muito saber que é inacessivel, mas mesmo assim, não vejo fim na minha luta. É complexo e por isso, decifrá-lo é algo que não tento fazer. Tenho pena por Vénus, amor platónico e inacessivel, porque depois de saber que se esgota, é ele que sofre, mesmo por ser como é. E é por este amor ser de determinada forma, que veio a existir este outro amor.
Chama-se Adónis. Entre outros, é o amor carinhoso, atento a tudo, doce e amável. Esplêndido e charmoso, este amor possui caracteristicas que o fazem permanecer. É bonito, é forte, é ideal, é amigo, é doce. Adónis domina-me quando está perto, acaricia-me e beija-me mesmo sabendo que não é o único amor que existe numa vida ainda tão precoce. Mas mesmo assim, é atencioso e convida-me a amá-lo, nunca a negá-lo. Porque sabe que embora não seja o único, é um e isso é bastante. Basta-lhe saber que o amo! Tem traços de menino prendado. Pensa em ser alguém um dia, mas por enquanto, limita-se a ser ao meu Adónis. É belo e sorri e faz-me também a mim sorrir! Conhece-me. Não muito, mas parece que me conhece bem. Completa-me como Vénus, mas esta nega-me. São ambos amores, mas Adónis é diferente. Tem estilo, é tentador e deseja-me. Quando me toca, quero que aquele momento não acabe, quero que nos petrifiquem e que nos deixem pelo menos o coração a bater. É curioso, gosta de saber se estou bem ou se poderia estar melhor. Embora Vénus tenha bastante avanço, começa a embater-lhe na fronteira que os separa. Adónis exige ganhar a batalha. É musculado e fisicamente bem posto. Possivelmente, talvez ganhe.
Começo a cansar-me de lutas sem fim á vista, de lutas incompreendidas, apenas porque um dos amores é cruel e me nega com todas as suas forças. Não te compreendo, mas não vou tentar fazê-lo mais.
Tenho dois amores! Para quê lutar por um que não dá valor á minha luta enquanto tenho outro que morreria por mim?

sábado, 10 de janeiro de 2009

O beneficio da certeza

Sabe bem estarmos certos de alguma coisa, mesmo que certa não esteja essa coisa qualquer. Mas quando pensamos que estamos certos, rapidamente nos apercebe-mos de que essa certeza se desvanece e passamos de estar certos a estarmos redondamente errados. Porque a certeza é vã e dura pouco, porque hoje em dia é quase impossivel ter certeza de alguma coisa, mesmo que seja uma coisa qualquer. Disso tenho eu a certeza, embora me digam que possa estar errada. É verdade, errar é porque temos certezas erradas e depois deixa-mos de as ter. Porque acreditamos que a certeza dura e é certa, mesmo quando se trata de alguma coisa qualquer. Essa coisa qualquer influencia a certeza, porque existem questões ás quais nunca podemos dar uma resposta certa. Com certeza que sim, porque para além da certeza, existe um termo mediano, que se chama beneficio da dúvida ou mesmo a própria interrogação, se realmente temos certeza no que dizemos ou não passamos de mentirosos compulsivos a mentir-mos a nós próprios. Mas em tudo, há que esquecer a certeza e oferecer probabilidades, de modo a romper com essa dúvida e a ter a tão desejada certeza, que no fim de tudo, pode nunca ser certa.

Moléstia

Subentendo que sou um pedaço de carne para os leões esfomeados. Subentendo que vivo porque respiro. Subentendo que sou prisioneira, porque se recusam a libertar-me. Subentendo que sou humana, porque os reles humanos pensam e pensar incomoda e quando me incomodo, não me resta mais que escrever. Subentendo que no fim, lerei tudo desde o inicio e sentir-me-ei um pouco melhor ou quiça quem sabe, desejarei acabar com o mundo e com a maioria da multidão que me olha de lado e se molesta, quando eu levo uma vida de passagem, e não me incomodo com nada nem ninguém. Por isso mesmo, não acabarei com o mundo. Deixarei que se consumam na sua maldade, no seu pranto, no seu ódio, que se cobiçem uns aos outros, porque a mim, não me molestam nem me sinto de algum modo molestada. Mas se escrevo porque me incomodo, então molestam-me…Já nem sequer sei o que é ser molestada, o que é ter moléstia e sentir-me incómoda. Porque será? Humm…talvez porque vivo molestada constantemente, por nada nem ninguém, apenas nasci com moléstia, ou aliás, nunca devia ter nascido. Eu sou a moléstia, que tanta energia cobra e tanto suor exige! Mas a minha moléstia, não me cansa. Sou persuasiva, gosto de fazer pressão e ser pressionada, talvez por ser mesmo molesta. Mas há pessoas, que mesmo molestadas, não se cansam, e isso não me agrada. Porque a minha moléstia gosta de prevalecer, de ficar mais um pouco. A mim, molesta-me o nascer do sol, gosto muito mais da noite. Molesta-me a saudade, mata-me por dentro. Molesta-me amar, corroi-me as entranhas. Molesta-me estar viva, porque tenho que respirar. Molesta-me andar por aí, porque nada há a fazer. Molesta-me dormir, porque se desperdiça tempo. Molesta-me a agua, porque não sei nadar. Molestam-me os anjos, porque circulam á minha volta, na esperança que me torne num deles. Molesta-me o Diabo, porque me puxa ao abismo mesmo sem eu querer. Mas eu incomodo-me e arrebato-lhe a sua moléstia. Fico como nova! Ninguém decide por mim, eu tomo decisões e sei que caminhos seguir. Eu sou a profeta, a visionária de um mundo superior a este, por isso me molesto e escrevo, porque algum dia, darei provas que me molesto, que realmente fico incomodada com tamanha incerteza, com tamanha vergonha e descaramento, com tamanho silêncio, com tão poluido ar, com pobre doença, com eximia morte, com tanto sofrimento e duras batalhas. Porque a moléstia é o inicio de um fim muito mais doloroso.

Plegárias


Não me deixes assim! Não me faças perder nesse teu mundo por achar! Peço-te: ajuda-me! Faz-me companhia. Senta-te comigo á beira rio e olha para mim, nem que seja por compaixão. Guia-me, eu deixo que me guies. Mas não me abandones. Por favor! Ajuda-me! Não me deixes assim sem saber de nada, sem saber se quero viver ou morrer sem ti. Nunca! Por favor! Peço-te! Não me vanglorio mais! Não te maço com meus pecados, mas ajuda-me. Chega-te a mim e dá-me a mão. Não me abandones, não me dês motivos para desistir. Ainda te amo, sei que continuo a querer-te. Não me apoies, mas ajuda-me. Não me deixes, mas suporta-me. Não me abandones, mas protege-me. Amo-te! Não consigo deixar de amar-te…

quarta-feira, 7 de janeiro de 2009

SuperWoman

Escrevi-te, desejei-te tudo de bom e nem um consolo passageiro da alma me deste. Haverá maneira de mudar quem és? Lamento tanto não ser uma super-mulher ou não ter misteriosos poderes de sedução…Assim foges-me, evitas-me ou na pior das hipoteses ignoras-me, fazes de mim uma palhaça sorridente, uma estática constante, uma frequência maltratada sem salvação, que ninguém ouve ou prefere não ouvir. De uma vez por todas, se não consegues lidar com o meu amor, proibe-me de te amar! Sabes que só tu podes fazê-lo…Nega-me a possibilidade de seres especial e se for preciso, odeia-me! Só assim poderei ter uma outra chance, somente dessa forma, terei sossego. Não me tentes perceber por que nem eu me entendo a mim mesma. Não repares sequer em mim, porque me perco nesse olhar profundo e silencioso. Sei que não estás perdida mas começas a sentir-te como tal. Talvez mais tarde o estejas, porque não te enquadras nesta sociedade, neste mundo, neste universo. Começas a sentir-te como uma ilusão que se desvanece por vezes. Aliás, penso que sempre te sentis-te assim, embora transparecesses uma justiça tremenda, uma segurança exímia, uma conquistadora semblante, uma mulher totalmente diferente.
Admiro-te por interpretares tamanha personagem, mas a peça é outra. Tu sabe-lo, eu sei-o. A mais bem dizer, todos te conhecem unicamente por renunciares a quem és e tentares ser alguém que não se enquadra no teu corpo, corpo esse que começa a tornar-se escárnio, envelhecido por tamanha mentira em que vives. Não devemos temer quem somos, mas a pessoa em quem nos tornámos.

sábado, 3 de janeiro de 2009

Não mais "Porto Seguro"


Mesmo assim sinto-me ancorada nesse teu porto, sem saber se fico ou se parto para bem longe. Talvez encontre um porto melhor ou nenhum onde possa voltar a ancorar como no teu. Minha âncora soltou-se sem que me desse conta, marcou território e desejava a conquista. Mas a batalha era demasiado dura, o teu porto estava demasiado guarnecido de silêncio e mágoa. Fui obrigada a partir. Mas em nenhum outro porto tenho paragem.
Todos são demasiado inconstantes e submissos. Todos se inundam á força das tempestades e tormentas. Mas esse teu porto mantinha-se constante, sempre forte e visivel na mais arrasadora tempestade. E estranhamente, ancorava outro alguém que não eu. Desconheço tal rosto e tal humano temperamento, mas sei que ali pervalecia talvez á mais tempo que eu mesma. E prevalecerá, possivelmente á deriva pois no teu porto, é dificil encontrar o caminho de volta. É imundo de labirintos e analogias, não tem coordenadas. Nem tão pouco há mapas, que me levem a um caminho. És um porto sem Norte e sem Sul. E em ti ancorei, não procurando os pontos cardeais, mas tentando procurar-te a ti. Avarias-te minha bússula, meu astrolábio perdera-se no mar. Estava sem saídas, sem ajudas. Nem os deuses tiveram de mim piedade. E culpavam-me por ancorar em tamanho porto, onde sabia que não iria encontrar-te. Mas eu insisti e remei, remei até mais não poder. Cheguei ao teu porto e bloqueaste-me como a barragem bloqueia as águas fortes e pesadas. Minha sobrevivência puseste em causa e estavas certa de que acabaria por levantar minhas âncoras e partir. É curioso como esse outro que ancorara em ti, permanece ainda. As tempestades intensificam-se a cada dia. A mágoa que possuis, apodera-se do teu porto e transforma-o, não num porto seguro, mas numa paragem em que a sobrevivência se torna impossivel.